terça-feira, 7 de abril de 2015

1 Bilhão de motivos para rever Titanic


Em Janeiro de 1998, então com doze anos de idade, decidir gastar o troco que havia acabado de receber da moça que cortara meu cabelo em uma sessão de cinema no meio da tarde. De macacão jeans e o dinheirinho dentro do bolso da frente, peguei o ônibus e fui para o shopping disposto a assistir o primeiro filme que estivesse começando. Tinha uma sessão de Titanic em poucos minutos. A sala estava quase vazia, com no máximo umas 10 pessoas além de mim, e eu me sentei para ver o filme sem saber ao certo o que esperar. Internet nos anos 90 era praticamente inexistente, então a gente ia no cinema na maioria das vezes com bem menos informações sobre as produções do que hoje em dia. A única coisa que eu sabia era que se tratava de uma história de amor em meio a um naufrágio que, por sua vez, havia mesmo acontecido 85 anos antes. Três horas depois eu saí da sala de cinema chorando descontroladamente, totalmente desfigurado. Uma senhora no shopping me abordou, preocupada, perguntando se eu havia me perdido da minha mãe. Ela se afastou rindo quando eu disse a ela porque estava daquele jeito
Notícias sobre o filme começaram a se espalhar, e eu fiz a minha parte para ajudar. Em poucos dias o público estava indo em massa aos cinemas. Na semana seguinte não era mais possível comprar ingressos para o mesmo dia, então as pessoas iam embora com entradas para sessões dali a três, quatro ou mesmo cinco dias, isso depois de ter ficado várias horas na fila da bilheteria. Multiplex passaram a ter  metade ou a maioria de suas salas exibindo ao longa, mesmo assim sem dar conta da demanda. Existia ovrebooking de ingressos e em várias sessões as pessoas se sentavam no chão, espalhadas pelos corredores das salas, e naquela época ninguém reclamava. Nas bancas de jornal só se via o rosto do Leonardo DiCaprio na capa de todas as revistas para adolescentes. A Leo-Mania foi global. 


Todas as emissoras de TV exibiam uma enxurrada de documentários especiais sobre a história do navio "inafundável" que, ironicamente, afundou em sua primeira viagem. Até uma transmissão ao vivo de uma expedição aos destroços foi feita pelo Fantástico, embora ninguém tenha conseguido ver absolutamente nada. My Heart Will Go On tocava no rádio a cada 10 minutos e todo mundo passou a saber quem era Celine Dion. Cada vez que um parente ou amigo ia cinema lá ia eu de novo, feliz da vida, pipoca em uma mão e lencinho na outra, pronto para me acabar mais uma vez. Em uma das vezes fui com um amigo da escola e fiz ele passar vergonha no shopping de tanto que eu chorava. No total eu compareci a 12 sessões do filme naquele ano. A trilha sonara composta por James Horner  foi o primeiro CD que eu comprei na vida. No final do ano paguei R$ 80,00 (uma fortuna em 1998, acredite) em uma caixa de luxo com duas fitas, cheia de fotos... a coisa mais linda. 


Titanic ficou quase um ano em cartaz e foi a primeira produção a ultrapassar a barreira do 1 bilhão de dólares em bilheteria, feito alcançado por pouquíssimos filmes até hoje, isso sem a ajuda dos ingressos mais caros das sessões 3D que impulsionaram seus colegas bilionários. E muitos críticos apostaram que o filme seria um enorme fracasso, veja só. Todo mundo embarcou na açucarada história de amor proibido, a menina rica se apaixonando pelo rapaz humilde porém de espírito livre, totalmente diferente do burguês cretino a quem ela está prometida. A relação de Jack e Rose é construída de forma orgânica e natural, e os atritos que acabam surgindo ao redor desta relação, com a mãe e o noivo de Rose, estabelece para o público o abismo social entre os passageiros das diferentes classes sociais a bordo do navio.


E essas diferenças não são apenas no luxo das acomodações que ocupam, mas nas chances que cada um teve para lutar pela sua sobrevivência. As cenas onde os passageiros da terceira classe são impedidos de entrar nos botes ou até mesmo de terem acesso ao exterior do navio durante o naufrágio são chocam pela brutalidade e pelo desprezo com os quais eles são tratados. Toda a sequência do naufrágio é um espero técnico e narrativo notável. Usando diferentes técnicas de efeitos especiais, James Cameron conseguiu retratar de forma impressionante um dos acontecimentos mais marcantes do século passado. Até hoje as imagens do navio em seus momentos finais é de arrepiar, ele com a popa inclinada, a água invadindo com violência os salões e arrastando a todos que encontra pela frente, as pessoas caindo por pelas beiradas no desespero de se salvarem, os corpos congelados no mar... E pensar que aquilo tudo aconteceu de verdade é ainda mais perturbador. 



Essas cenas ainda impressionam mesmo 18 anos depois do lançamento, mesmo que alguns problemas possam ser encontrados nas imagens digitais e no chroma key, mas nada que incomode muito. É no significado das imagens que está a verdadeira força do filme. Impossível se esquecer da cena da mãe colocando os filhos para dormir ao perceber que não irão conseguir se salvar, do casal de idosos que se deitam para esperar o inevitável chegar, do capitão covarde que se tranca na ponte para não precisar encarar as consequências de seus erros, dos passageiros da terceira classe trancados como animais nos andares inferiores ou da banda tocando a música mais triste do mundo enquanto tudo desaba a sua volta.


Duvido que você não chorou nessa cena.

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